domingo, 21 de agosto de 2016

Queráute, a malha do espírito livre

"Queráute" a ser tocado em casa de Pista, mais
recentemente nas festas do Barreiro
"Bamboleio" faz-se soar de forma intensa, nostálgica e o mais característica possível, condensada por riffs rasgados, baterias frenéticas e difíceis de conter e essa ilusão do baixo (há uns tempos sustentada por Nick Suave) destingue Pista dos demais em território Punk (ou qualquer outra fusão relacionada).
"Queráute" no Outfest, ainda com Nick Suave
 "Bamboleio" é um álbum rock. Repleto de singles, prima pela consistência das faixas que a cada audição reinventam-se em algo novo, como se tratasse de um feitiço ou uma boa maldição. Passaram 2 anos e faixas como "Puxa" ainda soam a algo entusiasmante de se ouvir, "3-0" é o clássico que faz a banda aparecer no radar e "Salmão" é aquela canção que estereotipa um dia de verão passado na piscina com todos os amigos e algumas pessoas que não querias ver, cervejas frescas e bons grelhados a acompanhar o convívio. Toda essa temática construída à volta do tropicalismo, sol, verão, praia, dão também um carisma incontornável e único a Pista.
"Queráute" no Time Out (Montijo)
 No entanto, existe sim essas influências Pós-Punk em certos momentos mais marcantes de Bamboleio... Falando de "Queráute", última faixa desse "disco verde", um épico de 12 minutos que se eleva de minuto para minuto, de acorde para acorde, de batuque para batuque. Essa efervescência inédita coloca Pista num patamar inalcançável e incalcinável. Aqui vemos força obscura capaz de suportar a banda ao longo de próximos discos e aqui vemos uma faceta enérgica fora do comum. "Queráute tem nove minutos porque Yes we can... Ou então porque não queremos que passe em lado nenhum...", explica Cláudio. Queráute suplanta-se e exprime inquietação, um freak punk ágil e sagaz, destemido e incrivelmente hábil na conclusão das suas obrigações como chave de ouro. Um eterno grito de potencialidades infinitas no som de Pista que pode metamorfosear naquilo que Cláudio, Bruno e Ernesto bem entenderem.
 O intuito progressivo e o mantra infinito, vocal hipnotizante e desconfortante... A voz rouca de Cláudio e Ernesto, enfraquecidas pela força da repetição incutidas na palavra... A verdade é que nos últimos concertos de Pista, Queráute tem-se tornado num dos momentos mais marcantes e memoráveis de qualquer concerto da banda. Alex D'alva Teixeira (D'alva) tem acompanhado a banda pela estrada, apoiando Cláudio nos back vocals. Essa presença e energia evidente de Alex colocam Quéraute num pedestal enorme. O público manifesta-se de várias formas, quer dizer, já vimos gente inconformada com o ruído insuportável, cabeças agitam em tom de concordância e consenso, corpos agitam-se com a inquietude do ritmo, já houve relatos de paralisia... Todas estas manifestações ocorrem de acordo com a gravidade da faixa, ora curta e convencional ora prolongada por um estado de espírito insolente. Toda essa atitude Punk é necessária para que a música seja tocada de forma mais crua e visceral possível.
No Super Bock Super Rock deste ano um grupo de
pessoas baixa-se durante "Queráute", sobre a repetição da
palavra e a descarga de adrenalina que envolvia o grande momento
da explosão

Essa prolongação carregada de feedback, dissonância, ruído branco (por vezes) e o habitual guincho vocal são alguns dos momentos mais marcantes de toda a cena underground atual. Para fotógrafas como Vera Marmelo, captar momentos tão incomparáveis como estes são só pequenas formas de homenagear este pequeno (12 minutos) monumento Punk chamado Queráute. Ao longo dos anos a faixa ganhará ainda mais importância e com o tempo influenciará outros rebentos a criar uma banda de Punk. Quanto a "Bamboleio", outros dos discos mais notáveis alguma vez feitos em Portugal, ficam dois sentimentos. O primeiro é o querer e a vontade de ouvir estas eternas faixas para todo o sempre, sem alguma vez nos cansarmos delas ou ficarmos saturados, seja no disco ou ao vivo. O medo que um próximo disco não soe igual a este, a tristeza desse facto. O segundo sentimento: O amor e confiança que sentimos por estes três pioneiros não nos dão outra alternativa a não ser confiar cegamente em tudo aquilo que eles fizeram e que ainda haverão de fazer em prol da música cantada em português.
Cláudio em busca do feedback durante "Queráute", com
Alex D'alva Teixeira a fazer vibrar o público no
Super Bock Super Rock deste ano


Todas as fotos são de Vera Marmelo. Vejam o seu trabalho aqui.

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