quarta-feira, 27 de abril de 2016

Entrevista aos Capitão Fausto:



Corremos mais rápido que gazelas, deixámos esse sol cair e contámos os nossos dias só para falar com uma banda de Lisboa chamada Capitão Fausto. Falámos sobre nihilismo, criaturas híbridas, máquinas do tempo e Harry Potter. Leiam a entrevista que fez El Salvador lacrimejar a rir e a banda a revisitar melodias que por ficaram por utilizar.

MS - Esta é uma pergunta para todos, particularmente para o Francisco. Vocês puxaram um vídeo há duas ou três semanas, e Francisco, tu estavas bué revoltado naquele vídeo… (risos)

Francisco Ferreira - Tava e não tava… Foi uma brincadeira!

MS - Mas o que é que vos levou a publicar aquilo?

Francisco Ferreira - Achámos piada, tava só a ser parvo! Nos ensaios tou a brincar e nós tínhamos imensos vídeos para promover o disco e esse era um muito estúpido… Depois tínhamos outros igualmente parvos mas esse acabou por ser mais parvo que os outros.


MS - Com o estatuto que vocês já alcançaram com os Capitão Fausto, já pensaram mudar o vosso nome para Almirante Fausto?

Francisco Ferreira - Não é a primeira vez, perguntaram isso para aí há dois dias! Perguntaram-nos se não devíamos ser Major e eu não não não. Achas que devíamos ser Almirante? (dirigindo-se aos colegas).
Segue-se uma discussão sobre os títulos da hierarquia militar, em que Domingos Coimbra revela que o seu pai foi Alferes e que tinha trinta soldados à sua disposição na qual Francisco Ferreira revela que, em criança, chamava Power Ranger ao avô em virtude do seu título militar.


MS -  Dizem por aí que neste terceiro disco saíram das saias da mãe. Resumindo em apenas uma frase, qual seria a mensagem principal deste vosso eterno retorno?

Francisco Ferreira - Aí vou discordar… Vá, eterno pode ser.

Tomás Wallenstein - Eu percebo porque é que é eterno, é eternizar um retorno.

Francisco Ferreira - Mas “retorno” parece que vieste de um fim quase eminente…

Tomás Wallenstein - Não, nem sequer é um reinício, é um capítulo. Não sei se há propriamente mensagem, acho que somos mais nós a pensar por nós próprios como é que vamos fazer a partir de agora. Acho que o disco é um bocadinho uma reflexão… Parámos para pensar e olhar para trás e fazer uma síntese… Vamos ver como é que vamos fazer a partir de agora.


MS - Como é que sabe esgotar o Lux duas vezes seguidas?

Capitão Fausto - É porreiro!

Domingos Coimbra - O que seria se nós disséssemos que não sabe muito bem…

Manuel Palha - Ficámos contentes e se já esgotar um era bom, esgotar dois é ainda melhor! Três e quatro também seria melhor.


MS - Dezassete já não é bom?

Domingos Coimbra - Dezassete já é demais. Já é a utilidade marginal decrescente.


MS - Após esta mudança, sentiram também uma mudança geral por parte do vosso público?

Tomás Wallenstein - Ainda não conseguimos tatear muito bem.

Francisco Ferreira - É o segundo concerto que estamos a dar com o disco, hoje, então ainda não temos dados suficientes.

Domingos Coimbra - Eu sei, por exemplo, que algumas pessoas mais velhas do que eu têm-me dito que gostaram mais deste disco do que dos outros mas isso não é propriamente representativo da amostra total. Mas algumas pessoas mais velhas, ou seja, quarenta, cinquenta anos, sessenta… têm gostado muito do disco. E se calhar dos outros podem não ter gostado tanto, não sei muito bem mas tenho tido algum feedback positivo.


MS - Vamos falar desse disco. Então quais foram os maiores desafios na concepção de “Capitão Fausto Têm Os Dias Contados”?

Domingos Coimbra - O que custa mais para nós é a primeira música, a primeira ideia, é o que demora mais tempo a arrancar. O arranque é o mais complicado, o maior desafio, porque a partir do momento em que se consegue fazer ou uma ideia, duas ou três, depois já percebemos rapidamente para onde é que queremos começar a caminhar. O grande desafio é sempre começar.


MS- Mas por exemplo, vocês têm linhas melódicas mais complexas e acrescentaram mais instrumentos neste disco. Consideram isso um desafio ou surgiu naturalmente?

Domingos Coimbra - Essas coisas saem-nos naturalmente. O disco não é melhor, pior ou muito diferente pelo número de instrumentos que tem.

Francisco Ferreira - Foi mais pelo prazer do que pelo desafio de fazer essa construção toda, enquanto que o outro disco tem uma exploração mais sónica este tem uma exploração mais melódica. Mas isso não foi um desafio, deu-nos mais prazer.

Tomás Wallenstein - Se há algum desafio é de facto a escolha inicial… nem sequer é muito temático mas um bocado “O que é que vai unir as músicas todas?” e qual é que vai ser a estética. No fundo, a estética é aquilo que tu pareces, o que nós escolhemos parecer para agora. Acho que, ao princípio, é o que demora mais tempo a sair.


MS - Este disco tem uma aura mais nihilista. Estavam a conter esse lado?

Tomás Wallenstein - Não me estava a conter muito, acho que é atual. Eu senti que quando escrevi para os outros discos estava também a tentar ser o mais honesto possível e fiz algumas escolhas de ferramentas que nestas já percebi quais é que gostei mais e menos e o que é que me apeteceu trabalhar mais ou menos e mudar. No fundo acho que a intenção sempre foi parecida, não andava a conter para sair agora.


MS - Quem é o mais nihilista do grupo e como é que isso se reflete no dia-a-dia?
(todos concordam que é o Francisco Ferreira)

Francisco Ferreira - Sou muito. Não sei, entristece-me um bocado aperceber-me disso (risos).

MS - Não é uma coisa necessariamente má…

Francisco Ferreira - Eu lembro-me que na altura em que estava na faculdade tinha um desejo um bocado mórbido de fazer trabalhos à volta do nihilismo. Sempre que tinha um trabalho teórico que tivesse que associar a um pensamento associava sempre ao nihilismo e acho que isso reflete-se um bocado em mim. Obrigado malta, por me elegerem o nihilista do grupo (diz aos restantes).


MS - Numa fase da vossa vida em que Alvalade já chamou por vocês e que já padecem do peso das contas para pagar, também há que investir. Até ao fim do ano, que sonhos a nível profissional podem partilhar connosco? Ou mais utópicos?

Domingos Coimbra - No meu caso, ser bilionário. Até ao final do ano. Eu acho que é realista. Vocês não acham?

Tomás Wallenstein - Ah, completamente.

Domingos Coimbra - Daqui a seis mesinhos estamos nas Caraíbas.

De seguida, disparam bitaites que justificam esse enriquecimento exponencial, num imaginário que envolve a banda a ser comprada ora por chineses, ora por um “Abramovich da música”.


MS - Quando forem bilionários, vão começar a ouvir Força Suprema?

Momento de ligeira satirização aos Força Suprema, grupo oldschool de rap de bairro. "Quem são esses?" questiona-se Tomás;  "Isso é algum tipo de movimento ou banda ou assim? Isso é uma editora? Fica onde?” brinca Manuel Palha.


MS - Se tivessem uma máquina do tempo que vos permitisse regressar para a fase do "Gazela", o que é que diriam a vocês mesmos?
Os Capitão Fausto exclamam um “haaaam” em uníssono e tentam chegar a uma resposta comum, “uma maneira mais realista de transformar a ficção em ciência”, diz Francisco Ferreira. “Se fosse mesmo em ciência, o que aconteceria era que qualquer coisa que disséssemos a nós ia alterar os factos do percurso que nos fez chegar até aqui, e como eu estou a gostar de estar cá…”.

Tomás Wallenstein - Para sistematizar, se fosse agora para fazer o Gazela, provavelmente teríamos feito de uma maneira diferente. Mas na altura acho que fizemos aquilo que pudemos, não havia grande coisa a mudar. Eu acho que uma pessoa não faz exatamente o que quer, tenta fazer o que quer, mas faz o que pode. Porque está limitado com as capacidades, com as ferramentas, com o conhecimento.

Domingos Coimbra - Eu acho que se o meu Eu do passado visse o meu Eu do futuro ficava um bocado triste e assustado porque estou muito mais gordo e com pior cara.

Recordam os vídeos do Manuel, da fase do Gazela e desabafam que estavam todos com um ar mais fresquinho e com uma cara mais limpa. Como vos compreendemos…


MS - Como é que o Gazela podia ficar melhor, não consigo ver como, sinceramente…

Tomás Wallenstein -  Se calhar, com outro conhecimento, tínhamos gravado aquilo de uma maneira diferente. Acho que era assim a principal coisa que eu ia atacar logo.

Domingos Coimbra - Aquilo é um bocado a coisa do momento e o álbum seguinte é a coisa daquele momento e este aqui foi o deste momento. Não há grande coisa a controlar.

Francisco Ferreira - Fiquem bem ou mal, o melhor é deixá-las estar, para depois aprendermos com elas.


MS - Como lidam com os comentários negativos, depreciativos e de teor não-construtivo referentes ao novo álbum?

Francisco Ferreira - O pior são os não-construtivos. Agora depreciativos...


MS - Sim, fiquemo-nos pelos não-construtivos.

Francisco Ferreira - A opinião que tenho para os comentários não-construtivos é a mesma que tenho para os comentários positivos. Vou falar de uma experiência muito recente. Ainda há pouco tempo li uma crítica ao nosso disco, um parágrafo curto ou dois e isso era uma das razões por não ser muito construtivo. Era supostamente uma crítica, dava uma pontuação e falava muito bem sobre o nosso disco mas não construía nada o porquê de gostar do disco e isso não me deu prazer nenhum, eu não retirei muito de ler esse texto. Tenho exatamente a mesma opinião para as críticas depreciativas em que não gostam das coisas, porque se não for construtivo...

Tomás Wallenstein - E mesmo quando é construtivo é natural haver pessoas que não gostam!

Francisco Ferreira - Dá-me gozo ler uma crítica de alguém que não goste e que se for muito bem construída...

Tomás Wallenstein - Isso dá argumentos às pessoas que gostam. As pessoas gostam por certas razões e as pessoas que não gostam têm as suas razões para não gostar. E o facto das pessoas que gostam também gostarem tanto é por aquilo causar discussão. É natural, eu não gostava que toda a gente gostasse.


MS - Como é que convenciam, apenas com palavras, um puto da escola básica a gostar do vosso trabalho? 
A banda consente que não entraria em palavras e ainda discute como é que poderia ser feita a abordagem.

Domingos Coimbra - Mekié meu puto? Vais aí ao YouTube e pesquisas Capitão Fausto, e ele ia ouvir.

Francisco Ferreira - Acho que não nos cabe a nós estar a fazer uma apresentação ou até um incentivo positivo promocional da nossa banda, não nos cabe a nós.

Tomás Wallenstein - O que nós fazemos é mostrar só. Se às vezes, em algumas entrevistas perguntam-nos para nós nos analisarmos, estão a pedir para termos um olhar analítico e isso quase se torna em como se nós nos tivéssemos a vender a nós próprios. Acho que não nos cabe a nós estar a vender essa parte.

Francisco Ferreira - Não é justo porque nós, à partida, vamos sempre gostar.

Tomás Wallenstein - Nós apresentamos a coisa de uma maneira passiva e quem gostar gosta, quem não gostar, não gosta. Se o miúdo fosse gostar, à partida não precisava de ser convencido a gostar... Mesmo uma criança.


MS- Voltando então a uma das perguntas anteriores, se tivessem uma máquina do tempo que vos permitisse voltar à fase do Gazela... 
Deu-se um break no alinhamento das questões, visto que um membro do Montijo Sound decidiu trollar (ele diz que não), e repetir uma questão outrora feita. As gargalhadas servem de arranque para a descoberta de ideias mais firmes:

Manuel Palha - Eu tentava evitar, quanto muito ia ver coisas que não tinha visto. Eu fazia como no Harry Potter, com o vira-tempo, eles não podem interferir no tempo.


MS - Mas há o Pensatório e o Vira-tempo. O Pensatório ainda é melhor porque não há influência na ordem das coisas

Manuel Palha - Eu ficava ali mesmo a ver e a dizer "epá que fixe" e ia-me embora.

Domingos Coimbra - "Pá, dá-lhe aí meu puto!"

Manuel Palha - Mas dizia de longe, tipo "força, dá-lhe aí!".


MS - Imaginem uma personificação do vosso álbum, tudo aquilo que escreveram e compuseram é agora um ser humano. Se lhes fosse feita a clássica questão "o que é que dizem os teus olhos?" o que é que acham que este ser, o vosso filho, responderia?

Francisco Ferreira - Eu tou a imaginar um ser humano careca, com os olhos sem cor...

Todos concordam que diria uma espécie de charada: "Se eu sou tu, quem sou eu?"

Francisco Ferreira - Eu acho que ia ser muito enigmático. Tal como a forma dele, acho que ia ser um ser sem forma, sem conseguires definir muito bem como é que ele seria, não ser humano mas bué pálido e sem pêlos nenhuns... Com um ar básico, muito humano e quase sem forma. Não percebes a raça dele (risos), claramente humanóide.


MS- O vosso som é uma coisa introspetiva, então? (tendo em conta que os Capitão Fausto classificaram a anterior charada como instrospetiva)

Concordam em uníssono e desenrola-se uma discussão cuja conclusão é a de que não falam de temas em específico senão deles próprios.


MS- Como é que acham que iniciativas como o Montijo Sound pode ajudar bandas pequenas, que estão agora a começar, a tornar-se Capitães?

Francisco Ferreira - Pá, qualquer promoção que se faça de qualquer banda, seja pequena ou grande, é ótima! Nós fazemos um bocado disso também, nós tentamos falar com o máximo nº de pessoas possíveis... Tanto quando começámos, como agora! E se algum sítio tem disposição de pegar em bandas menos conhecidas e o faça numa base diária... é muito mais que positivo.

Tomás Wallenstein - Eu acho que também tem a ver com o tipo de entrevistas que se fazem e eu até achei que vocês fizeram uma entrevista bastante interessante. Regra geral, muita gente que tem um blog depois não chega a ter ideias para ter uma conversa qualquer e não é preciso levar-se muito a sério e acho que para ser lido tem que ter o mínimo interesse, não pode ser daquelas perguntas de bê-á-bá e apoiamos, acho que é importante. Até para as bandas que estão a começar, para sentirem que as pessoas interessam-se pelo que elas pensam... também as faz questionar-se a si próprias. Portanto acho que são iniciativas muito boas... e desejo muita sorte. 

MS- Qual foi a faixa que vos deu mais prazer gravar e produzir? Vamos ouvir cada um, a começar pelo Francisco.

Francisco Ferreira - Para mim, muda de dia para dia. Porque eu, a certa altura, lembro-me duma música, o prazer que ela me deu e fico a pensar um tempo nisso durante algum tempo "Ya, isto foi buéda fixe de gravar" mas depois passa-se uma semana "ah, de facto esta foi bué fixe de se gravar, também". É uma coisa muito transitória, acho que é impossível ter uma resposta eterna. Acho que está ligado com a música que gostamos mais do disco, do meu ponto de vista é uma coisa que está sempre a mudar.

Domingos Coimbra - A que me deu mais prazer de fazer e gravar (não é necessariamente a que eu mais gosto mais) foi "Os Dias Contados", porque foi a música que passou por mais fases e teve mais vezes para não ser aproveitada e eu sempre acreditei que aquilo podia dar em alguma coisa e acabou por dar. 

Manuel Palha - Eu também concordo... Nós sempre fomos da mesma opinião (risos gerais).

Tomás Wallenstein - A que me deu mais prazer foi a "Amanhã Tou Melhor" que não é de todo das minhas preferidas mas das que deu mais voltas.

Francisco Ferreira - Eu gosto de especificar que isto aqui que nós estamos a falar não é bem da gravação, que ocupa um curto espaço de tempo. O gravar é o fim de todo o trabalho que já foi feito.


MS - Como é que funciona esse processo de composição?

Francisco Ferreira - Todos juntos os cinco, depois o Tomás faz a letra, a melodia e a voz,.. Debatemos, mas fazer o instrumental, fazemos os cinco.
Atenção que este disco foi uma estreia para nós em termos de letra em papel... temos partes de disco escritas mesmo em pauta, nunca tínhamos.

Segue-se uma breve explicação: a banda contratou músicos profissionais que chegaram ao local de gravação, leram as pautas e gravaram.

Salvador Seabra- Concordo um bocado com eles, a "Amanhã Tou Melhor" levou umas voltas muito engraçadas. Desse disco, talvez, essa foi a mais desafiante,

A banda discute as alterações da música até esta ter o seu resultado final e deixaram-nos com a seguinte mensagem:


"Shout Out para o Montijo Sound, por nos terem recebido e por nos terem dado alta entrevista, divertimo-nos bué!"


 Prezados agradecimentos:
Capitão Fausto
TimeOut Bar
Raquel Lains
 MontijoSound 2016

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